segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

VOZES D'AFRICA COMTEMPORÂNEA-RELEITURA

VOZES D’AFRICA CONTEMPORÂNEA- RELEITURA.

Deus! ó Deus!
por que não respondes
até hoje o meu grito
que há dois mil anos,
corre embalde o infinito?
Como já disse o poeta em
seus versos sofridos, escritos,
pela pena dos horrores
vividos em meio ao seio de terra.
Por não ouvires, estou quase
no fim em completa exaustão!
Em alguma estrela escondido,
embuçado nos céus, Permaneces!
alheio aos meus apelos, Desconheces,
o que fazem, de mim.
Mesmo amarrada ao meu deserto,
não é o sol candente que me deste,
o meu abutre; mas, antes,
as minhas irmãs, belas e ditosas
cujas as suas sombras voluptuosas,
cobrem-me de miséria e sofrimento.
Sobre mim campeia a fome, a aids,
a violência, que destrói meu povo em profusão
sob indiferentes olhares de quem goza das
benesses extraídas do meu chão!
Levarás mais dois mil anos para ouvir meu grito?
No meu areal, já não morre apenas o estafado
cavalo do beduíno, mas o meu povo
que sangra em vez das garupas, mas não pelo
chicote de Simoun, mas, pelo chicote do mundo.
Não mais, foi a terra de Suez, a corrente que
ligaste aos meus pés, mas, a nefasta corrente
do mundo que me puxa para baixo, me pisa,
me bate, me rouba, me sufoca, me rejeita,
me humilha, me abate, com avidez e fúria,
como se pagasse por todos
os pecados da humanidade.
Na realidade meu pecado é a negritude!
que Vós mesmo ma deste!
Não imaginava que me Usarias para teu deleite,
Teu descaso , Tua indiferença!
Não tenho as sombras voluptuosas como a irmã
Ásia, nem tenho haréns, ou se quer Sultão,
mas tenho fome, febre, inanição, falta de tudo que
de mim retiram me condenando a estagnação.
A Europa, enfeitei-a toda, com minhas pérolas,
meu ouro, e diamantes, jóias preciosas das
minhas entranhas, das minhas
serras dos meus horizontes.
E minhas peles dos animais silvestres,
Impiedosamente transformados em vestes?
Não tenho mais os elefantes brancos,
nem os brilhantes das plagas do Hindustão!
Mas tenho a seca que me queima o chão.
Não tenho o Ganges, nem o Himalaia,
nem tenho outro rio que me beija a praia,
muito menos corais ou brisa do Misora
que inflame o céu para que eu durma,
Em algum templo pagodes colossais.
Deus Brama, não é meu Deus,
meu Deus sois vós.
Mesmo embuçado em alguma estrela,
clamo por Ti, meu poderoso algoz!
Quando para mim Resolveres olhar,
Lembra que a América ainda
nutre do meu sangue, me libertou
da servidão humana, para que
eu morra pela liberdade, que
na verdade não pude ainda, alcançar,
pois que me livrou da escravidão
para me jogar na vil servidão!
Servidão das ruas, dos becos, dos guetos, do patrão!
Perdida e abandonada,não marcho mais em vão,
estou parada, anêmica, desnutrida, sem sangue
sem alma, sou pele e osso, sou lama, sou fome!
Por onde estou sou África
minha areia ardente, já não bebe o meu pranto,
se choro.... Nele me sufoco agonizante.
E sucumbo à minha tristeza infinita com a minha tez!
Não tenho a sombra da floresta, mas antes a da negritude,
que ofusca minha beleza, escondendo a natureza,
que a todos deu origem, como berço da genética,
das raças Hominídae, Homus Sapiens, variados,
pretos, brancos, amarelos todos frutos do meu ventre!
Se abrigo te peço, Senhor, não é mais de sobre
as pirâmides do EGITO,
mas é de Serra Leoa, com a força do meu grito,
ou é de Ruanda, Ruanda, onde a morte é coisa à toa!
Senhor ! Tende piedade, antes que a morte me roa!
Nem sei mais se o Saara me pertence ou se lá
albornoz faz diferença, ou se há petróleo embuçado
sobre o solo do deserto amortalhado pelo areal,
que não mais volve pelo siroco feroz. Certamente
esperam haver a ganância do ouro negro, onde muito
há de haver, para que eu seja sugada do néctar
mortal dos nossos dias para promover a esbórnia universal!
Meu deserto agora é meu calvário, pois já não há mais
água para o oficio do sudário, nem cardo medra em meu solo
nem boceja a esfinge colossal de pedra.
Só o poeta viu meus dias como são,
só lamento e sofrimento!
Não há mais cegonhas em Tebas
para ver meu horizonte sem fim!
Meu horizonte hoje é finito, e está perto,
não é mais um horizonte sem fim,
antes um horizonte negro,
negro de tudo que é ruim.
Mesmo sendo a África de Mandela,
Ninguém mais morre por ela,
mas, apenas se morre nela!
Não há mais caravana errante,
mas longos comboios delirantes,
que fuzilam, ai sim, errantes africanos
em busca do abrigo que não há!
E o pobre camelo monótono e arquejante
é apenas mais um dos habitantes,
cuja espécie vive em franca extinção.
Já não mais importa sua ação de
levar em suas costas , muita vez o povo
e a nação! Seu futuro é a substituição.
Sei que ainda não Te basta minha dor,
porque sei que em teu peito há
vingança e rancor. Não Te pergunto
o que fiz, porque crime nenhum
sei que não cometi, nem contra Ti, nem contra
ninguém, sei que Tu sabes muito bem!
Fitando o morno céu, vivo eu a te espreitar,
na esperança que me vejas, antes que eu morra!
Meus cabelos não ululam são
rígidos, me caracterizam.
Sim o anátema cruel é vivo sobre
o meu povo, não apenas ulula
sobre os meus cabelos.
A fome atinge mais a minha gente
que as plagas, não apenas o nômada!
E se a ciência fugiu do Egito, foi mais pela
sua negligência que pela minha anuência
pois nunca tive ciência ou sequer acesso!
Sim, sempre fui e sou pasto universal e
meus filhos as alimárias do mundo,
O sangue de Cristo até hoje não lavou a
minha fronte, mas, lava-a, o do meu povo.
Que anêmico cambaleia em busca de abrigo,
enquanto menos, eu posso lhe dá.
Em mim não se amestra falcão, mas, o homem!
Em mim não há José para vender os vis irmãos,
mas antes, estes aqui se vendem
em busca da sobrevivência, a cada dia menos provável.
Para mim pensam sempre numa ajuda, mas
nunca em algo capaz me dar liberdade,
de me reconhecerem no seio da humanidade!
De mim Senhor que Te importa meu grito de basta?
Ou Te pedir perdão pelo que
não fiz, se há dois mil anos o
meu grito embalde corre o infinito
para que Tu Ouças?
Mas não ouves, não queres,
não ouvirás jamais, pois me fizeste,
negra para que eu
Sinta o lado negro da humanidade,
manifestar-se na perversidade!
És responsável pelo que me fazem, me
És presente pela tua ausência,
Dormes tranqüilo
Sobre os Teus Poderes, da oniciência,
da onipresença e da onipotência!
Senhor! ó Senhor, pela menos uma
Vez, tende piedade de mim!...Sou África!

José Antonio da Silva – Cabo Frio, 26 de outubro de 2008.
( Castro Alves).

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